A partir do ano letivo de 2025, no Estado de São Paulo, os alunos das unidades escolares das redes pública e privada de ensino não poderão acessar dispositivos eletrônicos de conexão à internet dentro das escolas, por força da lei estadual n. 18.058, de 5 de dezembro de 2024.
A justificativa para essa medida é a associação entre o uso constante de dispositivos eletrônicos e uma diminuição significativa na capacidade de concentração e desempenho acadêmico dos alunos, além de menor interação social nos espaços escolares.
Por esse motivo, alteraram a lei anterior, de 2007, que já proibia o uso de celulares durante o horário de aulas nas escolas do estado, para que a proibição passe a abranger outros aparelhos e não só o tempo das aulas regulares.
Assim, a partir de agora, os alunos estão proibidos de usar e acessar celulares e quaisquer outros dispositivos que possuam conexão com a internet (como tablets e relógios inteligentes) durante todo o seu período de permanência na unidade escolar – inclusive intervalos de aula e atividades extracurriculares.
Só em dois momentos será liberado o uso: na necessidade pedagógica de ferramentas digitais para o desenvolvimento de uma atividade escolar ou para garantir a inclusão de alunos com deficiência ou condição de saúde que justifiquem o apoio tecnológico. Encerradas essas necessidades, os dispositivos deverão ser armazenados e mantidos inacessíveis.
Cuidados na aplicação da lei
A garantia de acessibilidade aos alunos com deficiência é a única hipótese a permitir o uso contínuo dos aparelhos eletrônicos, mas a lei exige que se comprove a sua necessidade.
Não ficou claro que tipo de documento será exigido para essa comprovação – e aqui mora o primeiro perigo: a possível exigência desproporcional de laudos técnicos específicos e a criação de caminhos burocráticos longos e custosos para as famílias dos alunos com deficiência para poderem exercer o direito fundamental de acessibilidade. Esse é o primeiro ponto de atenção das secretarias de educação nas próximas semanas.
A segunda dificuldade das secretarias de educação será a criação dos protocolos de armazenamento seguro dos dispositivos eletrônicos dos alunos que porventura os levem para as unidades escolares. Estranhamente, a nova lei trouxe a previsão de que os alunos assumirão a responsabilidade por eventual extravio ou dano caso exerçam a “opção do armazenamento”.
Esse ponto, bastante sensível, terá minha crítica. Não faz sentido que os alunos se responsabilizem por protocolos criados pelas secretarias – e a lei estadual não pode limitar responsabilidade que advém da Constituição Federal (no caso das escolas públicas) ou do Código Civil e do Código do Consumidor (no caso das escolas particulares).
Além disso, tratar o armazenamento como mera opção ignora a realidade de muitas famílias, cujos filhos, notadamente adolescentes, utilizam os dispositivos eletrônicos como aparato de segurança em deslocamentos que muitas vezes fazem desacompanhados;
Ainda, segundo a lei, as secretarias de educação deverão criar canais acessíveis para a comunicação entre pais, responsáveis e instituições de ensino. Essa parece uma previsão para acalmar aqueles que ainda não estão convencidos das vantagens de uma escola livre de aparelhos eletrônicos, mas a verdade é que as escolas já têm (ou deveriam ter) esses canais, na medida em que, durante o período de permanência dos alunos, são por eles responsáveis. Ou seja, a boa e velha secretaria já deveria cumprir essa interface, cabendo à toda comunidade escolar uma reflexão sobre como fazer um uso adequado destes canais.
É essa necessidade de conscientização que parece ter escapado à redação final da lei estadual n. 18.058/24. A educação digital, inclusive para uso seguro das ferramentas, já é um direito dos alunos amparado pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (essa uma lei federal, de n. 9.394/96, aplicável a todo o país), mas é um tema que precisa ser discutido coletivamente: escolas, famílias e Administração Pública.
Com sorte, a partir de 2025 e aproveitando o ensejo da nova lei, seja possível aprofundar o letramento da sociedade sobre o assunto.
Por fim, mas não menos importante, é preciso ainda entender especificamente quais são os alunos a quem a lei se destina. A previsão ampla de proibição nas unidades escolares não deixa claro se alunos adultos que estejam cursando os níveis fundamental e médio também estarão proibidos de acessar seus aparelhos eletrônicos.
Espera-se que a regulamentação da lei, a ser realizada por ato do Poder Executivo nas próximas semanas, seja elaborada de maneira cuidadosa para trazer apenas benefícios aos alunos paulistas, assim como tem acontecido em outros países.