Campina Grande, na Paraíba; Caruaru, em Pernambuco; Mossoró, no Rio Grande do Norte; e São Luís, no Maranhão, todas cidades de grande porte, são famosas pelo São João que extrapolam o mês de junho. Agora, já ouviu falar das festas juninas de Aracati, no Ceará; de Amargosa, na Bahia; ou de Piranhas, em Alagoas? Provavelmente, não.
Apesar de terem pequeno ou médio porte, estas cidades começam a interessar turistas pelas experiências que oferecem neste período do ano. Na real, não só ali: os municípios nordestinos dividem com outros do Centro-Oeste, Sudeste e até no Sul do país…
Tenho acompanhado o fortalecimento do turismo em cidades menores durante o período junino e esses destinos são bons exemplos
afirma Debora Peres, sócia da Iviva Viagens
“Aracati realiza um São João voltado às raízes culturais. A festa valoriza quadrilhas estilizadas, apresentações folclóricas e comidas típicas feitas pelas próprias famílias locais. É uma celebração mais afetiva, onde o envolvimento da comunidade é o que dá o tom”, relata Ive Cavalcante, sócia no negócio, sobre a cidade de 75 mil habitantes (segundo o Censo do IBGE 2002).
Amargosa, com quase 36 mil moradores, tem uma história mais consolidada e consegue unir estrutura com tradição. Segundo Debora e Ive, trata-se de uma das festas mais queridas do interior baiano, com shows, decoração típica e forró que atravessa a madrugada – tudo isso sem perder o clima caloroso e acolhedor do interior…
Já a alagoana Piranhas, com população inferior a 23 mil pessoas, se diferencia pelo cenário: é uma cidade colonial às margens do Rio São Francisco. Para as sócias, “a atmosfera histórica e intimista torna o São João bastante especial, com cortejos, forró pé de serra e muito foco na cultura popular”.
Em São João do Cariri (PB), com pouco mais de 4 mil habitantes (quase 100 vezes menor que a ‘vizinha’ famosa Campina Grande), a festa é 100% feita pela comunidade. “É uma celebração com fogueiras, trios de sanfona, quadrilhas e comidas típicas, bem no estilo das festas antigas, mantendo viva a tradição nordestina com simplicidade e autenticidade”, comenta Debora…
Marco Lisboa, CEO da 3,2,1GO!, cita São João do Sabugi, no Rio Grande do Norte, com seus 6 mil residentes (muito, muito menos que a população mossoroense, que soma 264,5 mil), como exemplo de lugar pequeno que tem atraído agências de viagens e turistas. “A festa é organizada pela própria comunidade e segue os moldes mais tradicionais: quadrilhas matutas, sanfoneiros locais e comidas típicas feitas em casa”, detalha…
Também no Nordeste, ele fala sobre Arraial d’Ajuda (17 mil moradores). “É um lugar curioso, que realiza festas juninas com toques afro-baianos, como o samba de roda junto ao forró, em meio ao clima litorâneo”, explica.
Fora do Nordeste
Bem longe dali, outra mistura que se destaca é em São Francisco de Paula, na serra sul-rio-grandense, onde ocorre uma mistura do forró com fandango, do quentão e do vinho quente com o pinhão na fogueira. “São elementos que dão uma cara gaúcha ao São João”, diz o CEO sobre a cidade com 22 mil residentes…
No Sudeste, a mineira Monte Verde (quase 5 mil habitantes), em Minas Gerais, combina o clima de montanha com o estilo junino mineiro, ou seja, muita comida de fogão a lenha, fogueiras gigantes e clima de interior.
No Centro-Oeste, temos Pirenópolis, que agrega tradições religiosas, cavalgadas e danças como a catira e a congada, tornando o São João também uma celebração histórica e cultural aponta Marco Lisboa. O município goiano agrega 27 mil pessoas.
Na mesma região do país, Isabelle Brito, coordenadora pedagógica dos cursos de Gastronomia e Nutrição da Universidade Tiradentes (Unit), indica Corumbá, no Mato Grosso do Sul, com pouco mais de 96 mil habitantes, onde ocorre em todo 24 de junho o “Banho de São João”…
Nessa noite, em procissão, os fiéis levam a imagem até o Rio Paraguai para banhar o santo nas águas do rio e caminham pelas principais ruas do município. A festa atrai multidões e movimenta a economia do município, localizado na principal porção do bioma Pantanal
descreve.
Tradições e raízes
As sócias da Iviva Viagens relatam que, nos últimos anos, o interesse é crescente por festas mais ligadas às raízes culturais. “Muita gente procura experiências que tenham a ver com a própria história familiar – são pessoas que nasceram no interior ou têm familiares que ainda vivem nessas regiões e desejam reviver tradições da infância ou juventude”, comenta Debora…
Na opinião de Ive, é um tipo de viagem com valor emocional muito forte. “Muitas dessas festas são divulgadas apenas em rádios locais, redes sociais da comunidade ou pelo famoso boca a boca, então o turismo ainda é, em parte, voltado a quem tem vínculo direto com o local”, observa.
O público das regiões mais baixas do país, especialmente Sul e Sudeste, ainda procura mais por festas estruturadas e com divulgação nacional, como Caruaru (cidade de porte grande, com 378 mil pessoas) e Campina Grande. “Mas para quem já conhece essas grandes festas, há um movimento claro de busca por algo mais autêntico, mais conectado com a cultura raiz do Brasil”, enfatiza Debora…
As grandes festas juninas são fantásticas, mas para quem busca algo diferente do tradicional, há uma série de cidades menores, com forte tradição rural, que vêm se destacando justamente por oferecer uma experiência mais autêntica e menos comercial do São João
confirma Marco Lisboa.
Estrutura limitada
Diferentemente das capitais e cidades bem maiores, os municípios pequenos que vêm recebendo turistas nos últimos anos não contam com hotéis e pousadas em grande quantidade. A estrutura costuma ser mais enxuta e voltada para o público regional. Por isso, é necessário planejamento e reservas de hospedagem com antecedência considerável…
Aos poucos, porém, estão se adaptando à demanda. “Amargosa já recebe um público maior há muitos anos, então tem um planejamento mais robusto e consegue absorver melhor a demanda. Aracati faz festas com forte participação da população local e foca principalmente no turista regional, o que ajuda a manter o equilíbrio entre estrutura e fluxo de visitantes”, exemplifica Debora Peres.
Corumbá é outra com estrutura condizente ao volume de pessoas que recebe. “Até recebe apoio do governo local a fim de incentivar o desenvolvimento ali”, comenta a professora Isabelle.
Para a docente, o maior desafio dos eventos realizados em cidades menores ainda é a divulgação, que tem o poder de atrair mais turistas, e consequentemente, potencializar a economia local…