Quando armazenado em um recipiente fechado, ele pode até cristalizar, ficar mais espesso ou granulado, mas não estraga. O que explica a resistência do mel?
A maioria dos doces, geleias e outras delícias armazenadas em potes tem uma vida útil bem limitada. Basta uma colherada mal dada para começar a criar mofo ou abrigar uma colônia inteira de bactérias.
Mas certos alimentos têm um poder de conservação peculiar e se mantêm próprios para o consumo por anos. O mel é uma dessas substâncias especiais.
Quando armazenado em um recipiente fechado, ele pode até cristalizar, ficar mais espesso ou granulado, mas não estraga.
Essa incrível resistência ao tempo se deve à química do mel e a forma como ele é produzido.

Abelhas realizam um processo de purificação do mel, que desestimula o aparecimento de micro-organismos.
Quando falamos que um alimento estragou, na verdade estamos dizendo que alguma outra coisa chegou ali antes que a gente pudesse comer, algo microscópico.
Bactérias, fungos e mofos estão presentes — mesmo que em pequenas quantidades — em muitos alimentos, e grande parte dos métodos usados pelos seres humanos para conservá-los serve justamente para evitar que esses micro-organismos a consumam.
Muitos desses micro-organismos preferem ambientes úmidos, com altas (mas nem tanto) temperaturas, um pH neutro, e grande quantidade de oxigênio para usar em seu metabolismo.
Assim, desidratar carnes ou frutas priva os micro-organismos de água. Cozinhar alimentos em alta temperatura e armazená-los dentro da geladeira mata boa parte desses seres e também desacelera o crescimento dos que sobrarem. Já vedar a comida em um pote limita a quantidade de oxigênio a que esses micro-organismos têm acesso.
Mas, mesmo alimentos que passam por uma verdadeira maratona de processos de conservação normalmente têm vida útil limitada.
A verdade é que estamos sempre travando uma batalha contra esses micro-organismos.
Seja aquele cheiro de vinagre que nos diz que o Lactobacillus tomou conta do suco de laranja, ou as manchas pretas de mofo nas laterais do pote da pasta de amendoim, os sinais da presença deles costumam ser bem claros — e inevitáveis.
O mel, no entanto, é um caso à parte. E existe um motivo para isso.
As peculiaridades do mel
O mel é produzido pelas abelhas a partir do néctar das flores. Ele começa como um líquido morno, aguado e açucarado, um tipo de fluido que parece um convite para as bactérias.
Só que no caminho até a colmeia, as abelhas concentram o néctar, retirando parte da água, e usando enzimas para aumentar o conteúdo ácido no líquido, o que desestimula o crescimento de algumas formas de micro-organismos e quebra os açúcares em formas mais simples.
Depois disso, as abelhas armazenam o néctar nos favos de mel.
Em seguida, elas fazem algo notável: ventilam o mel com suas asas. Essa ventilação evapora lentamente a água restante, como um ventilador evaporando o suor da pele.
Assim, aquela substância que tinha cerca de 70% ou 80% de água vai secando e secando.
O mel completamente maduro costumar ter entre 15% e 18% de água. Na verdade, a proporção das moléculas de açúcar para água é tão alta que seria fisicamente impossível dissolver tanto açúcar em tão pouca água sem um processo como o que as abelhas utilizam.
Há uma grande quantidade de açúcar ali, e claro que os micro-organismos adorariam se aproveitar dele. Mas com tão pouca água — e a acidez oferecendo um desestímulo adicional — eles simplesmente não conseguem sobreviver.
Além disso, ao vedar um pote de mel, limita-se também a disponibilidade do oxigênio, criando assim mais uma barreira para o crescimento desses seres.
Esse estado é conhecido pelos cientistas de alimentos como “baixa atividade de água” e, de fato, reduzir a atividade da água é uma técnica bastante comum para conservar alimentos processados.
É possível manter certos alimentos úmidos sem que estraguem, desde que as moléculas de água estejam ligadas a interações com sal ou açúcar, por exemplo.
Isso não significa que o mel resista a todos os desafios para se manter fresco. Uma vez que um pote de mel é aberto, a superfície começa a ser exposta ao ar com frequência, e colheradas lambidas trazem bactérias e umidade que não estavam ali quando o pote foi vedado.
Se isso acontecer, assuma o controle da situação adicionando água e um micro-organismo especial e você terá um hidromel — bebida alcóolica feita a partir da fermentação do mel — um tipo de “estrago” com o qual poucos se importariam.